O tratamento psicológico na Compulsão Alimentar
É necessário olhar para a compulsão alimentar tanto como sintoma como um problema em si. Sintoma na medida em que serve como uma muleta para lidar, de forma não ajustada, com o que a pessoa não é capaz de lidar e que a incomoda. Também é por si só um problema por se ter tornado um aspeto central na vida da pessoa que traz imenso sofrimento. Assim sendo o acompanhamento psicológico na compulsão alimentar faz-se perante estas duas dimensões: o emocional (sintoma) e o alimentar (o problema).
O que é Compulsão Alimentar?
A Perturbação de Ingestão Alimentar Compulsiva (PIAC) consta na DSM-V como um quadro autónomo e caracteriza-se:
- Ocorrência de episódios recorrentes de ingestão de grandes quantidades de comida;
- Sentidos como perda de controle em relação às quantidades e qualidade dos alimentos ingeridos.
Outros critérios:
- Ingestões mais rápidas do que o habitual;
- Comer até ficar fisicamente desconfortável;
- Comer sozinho ou escondido de forma a evitar a apreciação negativa de outros ou vergonha;
- Ocorrência de sentimentos de nojo, tristeza ou culpa após no final;
- Os episódios ocorrem, em média, pelo menos uma vez por semana durante três meses;
- A compulsão não utiliza estratégias compensatórias inadequadas para fazer face à quantidade de comida ingerida;
Segundo a DSM-V pode ser classificada de acordo com a sua gravidade:
- leve (1 a 3 episódios por semana);
- moderada (4 a 7 episódios por semana);
- grave (8 a 13 episódios por semana);
- extrema (superior a 14 episódios por semana).
Pode ser avaliada se está em remissão parcial (frequência de episódios em média inferior a uma vez por semana) ou em remissão completa (não ocorrem episódios de acordo com os critérios).
Porque devo procurar apoio psicológico?
A Perturbação de Ingestão Alimentar Compulsiva (Compulsão Alimentar) contribui negativamente para um conjunto de problemas emocionais, uma vez que conduz a uma hipervalorização de questões relacionadas com a alimentação, o peso, a imagem corporal, uma pior qualidade de vida, um funcionamento social e ocupacional comprometido, assim como uma maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de diferentes perturbações psiquiátricas. No fundo acaba por comprometer, se não todas, grande parte das esferas da vida dos pacientes.
Com a ajuda do psicólogo pretende-se identificar e modificar fatores que possam estar a favorecer o desenvolvimento e manutenção das cognições, logo dos comportamentos indesejados. A atuar na pessoa como um todo para que haja mudança na forma de pensar, sentir e agir, através de questionamentos, reflexões e ferramentas que sozinho a pessoa não terá, ou muito dificilmente, terá acesso.
Quais as abordagens psicológicas no tratamento da Compulsão Alimentar?
Independentemente da abordagem a que se recorra, importa perceber que o psicólogo siga estas duas linhas orientadoras – o sintoma (gestão emocional) e o problema (parte alimentar). Daí ser acompanhado por um psicólogo experiente no tratamento de perturbações alimentares ser diferenciador.
A Terapia Cognitivo Comportamental tem sido amplamente estudada e aceite como uma das principais abordagens para o tratamento das perturbações no comportamento alimentar. A TCC é uma intervenção psicoterapeuta que aborda fatores cognitivos, emocionais e comportamentais por meio de consultas semiestruturadas e com objetivos específicos. Aqui pretende-se identificar e modificar fatores que possam estar a favorecer o desenvolvimento e manutenção das cognições, logo dos comportamentos indesejados. A TCC assenta em duas premissas: as cognições influenciam e controlam as nossas emoções e os nossos comportamentos podem afetar os nossos pensamentos e emoções.
Sendo as PIAC multifatoriais a TCC ajuda a identificar e modificar as condições que favorecem o desenvolvimento e manutenção da perturbação.
A TCC tem-se mostrado útil e eficaz, principalmente no que respeita à modificação do sistema de crenças e dos pensamentos/sentimentos associados à alimentação e à imagem corporal. Ao incidir diretamente nos padrões alimentares perturbados, os seus antecedentes, preocupação excessiva com alimentação, peso e imagem corporal ajuda a melhorar cognições relacionadas com a alimentação e com o corpo. No entanto, apesar do foco de intervenção se debruçar maioritariamente nas questões alimentares e imagem corporal, nos últimos anos tem ampliado o seu campo de atuação a questões relacionadas com a promoção de habilidades sociais, melhoria da autoestima e perfeccionismo. Ou seja, aqui há um investimento para além do tratamento da perturbação alimentar. Dá-se atenção à ansiedade, autoestima, autoeficácia e desenvolvem-se outras competências que vão ajudar o paciente a sustentar-se no futuro autonomamente.
De que forma o psicólogo me pode ajudar?
É fundamental perceber que cada tratamento é único, mesmo que semiestruturado, atendendo às particularidades de cada indivíduo (os sintomas).
O campo de atuação do psicólogo nas perturbações alimentares, mais concretamente nas perturbações alimentares passa por:
- guiar e reconhecer os pensamentos, sentimentos e comportamentos para com a comida (daí a importância da equipa multidisciplinar e em particular do nutricionista, no que toca a escolhas por determinados alimentos);
- ajudar a perceber crenças que o paciente tem e descobrir memórias afetivas e sensações em relação a determinados alimentos e circunstâncias que o tornam mais vulnerável;
- perceber expetativas em relação ao tratamento, a si próprio, à alimentação e comportamento e avaliar se essas expetativas são realistas, saudáveis, sustentáveis;
- ajudar o paciente a aderir ao tratamento e à restante equipa multidisciplinar e a comprometer-se mesmo perante manutenção do quadro ou perante recaídas;
- atuar na rigidez – flexibilidade, sentimento de culpa, perfecionismo, autocriticismo, baixa autoestima, baixa autoconfiança e baixa autoeficácia alimentar;
- ajudar o paciente a refletir sobre a sua imagem corporal;
- ter um papel psicoeducativo, tanto com a família como com o paciente, no que toca a informação relacionada com a perturbação alimentar e ao que lhe está associado (i.e., piora da qualidade de vida, efeitos psicológicos, físicos e sociais em manter o comportamento; indução de vómito não elimina todo o alimento ingerido; efeito nefasto de laxantes e diuréticos; diferença entre fome física e fome emocional);
- ajudar a melhorar a relação com a comida retirando a culpa ao comer;
- ajudar no treino de resolução de problemas e de regulação emocional.
Conclusão
O papel do psicólogo na Compulsão alimentar é muito concreto, embora deva atuar não apenas no comportamento alimentar mas também no que faz a pessoa a recorrer à comida como forma de se auto-regular.
Das diferentes abordagens utilizadas os estudos são unânimes quanto à Terapia Cognitivo Comportamental como sendo a mais rápida e eficaz na remissão de comportamentos compulsivos.
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