-“Estás magra demais”; – “Deixa-te disso e come”; – “São coisas da tua cabeça”.
– “Estou muito gorda”; -“Por mais que faça nada muda”.
Quem está correto? Ambos, dentro da perceção de cada um!

O diálogo acima espelha a tão sentida desvalorização mencionada por quem sofre de perturbações do comportamento alimentar e obesidade. Esta desvalorização e dessensibilização é muitas vezes um travão na hora de se procurar ajuda e assim se manter/agravar comportamentos de risco à saúde mental e física.

Perturbações Alimentares e Distorção da Imagem Corporal

Nem todas as pessoas que não estão satisfeitas com o seu corpo desenvolvem alguma perturbação alimentar, mas todas as pessoas que sofrem de perturbações alimentares estão insatisfeitas com o seu corpo ou sofrem de uma perturbação dismórfica corporal (distorção da imagem corporal). Independentemente da tipologia da perturbação alimentar, a insatisfação com o corpo e a distorção da imagem corporal (nem sempre presente) é um ponto comum.

O que é Distorção da Imagem Corporal?


Distorção da imagem corporal acontece quando uma pessoa acredita que tem um tamanho/forma de corpo que não corresponde à realidade, ou seja, há uma desorganização da forma como é percecionado o seu corpo (por excesso ou defeito) por alterações de neurotransmissores cerebrais. Essa perceção, que é a sua verdade, influencia as suas escolhas comportamentais e o seu discurso interno (inferioridade, criticismo, julgamento…). A combinação destes dois construtos acaba por perpetuar um ciclo.

Como acontece?


A distorção da imagem corporal é constituída de pensamentos obsessivos/repetitivos em torno da imagem que preenche grande parte do dia da pessoa impactando negativamente as várias áreas da vida (educação, saúde, relacionamentos, trabalho e em última instância pode levar ao suicídio).

Isto acontece na medida em que o seu estado de humor e comunicação interna afeta a forma como se vê e a forma como se vê acaba por aos poucos interferir com a forma como vê e encara o mundo à sua volta. Esta obsessão que a pessoa tem pelo corpo perfeito, involuntariamente, causa um grande sofrimento, comprometendo desajustes e desequilíbrios nas diferentes áreas da vida. Embora possa manter preservada algumas áreas é, certamente, sob um maior esforço.

Importa salientar que não é a pessoa que cria intencionalmente essa realidade interna, efetivamente há uma desorganização na forma de se reconhecer. Isso explica o facto de uma pessoa que faça exercício físico várias vezes ao dia e que tenha uma dieta restritiva num resultado de perda de peso/alteração da composição física não o percecione. A distorção que tem do próprio corpo mantém a crença de que o corpo ainda está muito grande e distante dos seus padrões internos de referência. Nenhum comportamento compensatório tem o poder de alterar essa crença nem imagem uma vez que essa imagem é um registo da mente e não do corpo.

Sinais a estar atento


Existem sinais de que quem sofre de distorção da imagem corporal podem apresentar – o objetivo será sempre o de esconder/diminuir o tamanho do corpo para si e para o outro:

  • O uso de roupas largas;
    muitas vezes vestir-se sempre da mesma forma (peças de roupa com o mesmo formato, por exemplo);
  • Observar-se permanentemente ao longo do dia quer através de espelhos, fotografias, balança, como se fosse um ritual;
  • Comparação do seu corpo com outros corpos;
  • Comparação com o seu corpo num determinado período em que era mais magro (antes da adolescência, por exemplo);
  • Exercício físico de forma extenuante mantendo a crença de que o exercício não mudou a sua realidade.

Possíveis causas


Não temos acesso à realidade como ela é, temos acesso à realidade pelos nossos sentidos que é registado de acordo com experiências passadas, fatores psicológicos, familiares e contexto.

Situações/comentários/comparações na infância e adolescência aparecem muitas vezes como causa que são inconscientemente registadas como trauma para a pessoa, favorecendo o desenvolvimento da distorção da imagem corporal, e na grande parte das vezes nem há consciência desses registos.

A compreensão psíquica do porquê vai ser a condição necessária para a reconstrução cognitiva entre perceber o seu corpo e a informação que lhe chega da mente. Ou seja, este diálogo vai ajudar a aprender a olhar-se reconhecendo a sua forma e tamanho do corpo. Muitas vezes fica-se preso a idealizações de padrões que julgamos ser de referência com pouca flexibilidade para distanciamentos “quando pesar x é que vou ser feliz” e na verdade o que se verifica é que isso não acontece, pois parece que nunca há essa satisfação, nunca se é suficiente. Projeta-se no corpo a responsabilidade de uma vida feliz quando essa responsabilidade é multifactorial, quando essa responsabilidade não assenta num número na balança. Favorecer um diálogo harmonioso entre mente/corpo leva o seu tempo. Nenhum mapa que foi desenvolvido e percecionado por anos é apagado de um dia para o outro.

Tratamento


Não raras vezes pode ser necessário o uso de medicação para realmente facilitar a melhor comunicação do córtex pré-frontal quando se percebe que o acompanhamento de psicoterapia por si só se revela insuficiente.

Com a ressalva, obviamente, da importância da continuidade do acompanhamento psicológico sendo um meio facilitador para clarificar situações e auxiliar a explorar novas ferramentas e estratégias de mudança na relação consigo e com os outros. Explorar e trabalhar em consulta as possíveis causas desta condição é particularmente importante para que haja condições favoráveis ao descondicionamento e aceitação da sua própria imagem.

Conclusão


Não é mania, não é ignorância e não é manipulação intencional do real. Existe um conjunto de factores – genéticos, psicológicos, familiares e de contexto – que podem favorecer a distorção da imagem corporal. Trabalhar com seriedade e sensibilidade com as pessoas é o necessário a ser feito.

Olá, sou a Maria Duarte

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